Cecília Olliveira

Chacina de Castro não mirou o Comando Vermelho, mas sim a eleição de 2026

Entrar com a polícia e sair no dia seguinte não salva as favelas nem enfraquece o tráfico – mas Castro só quer saber da campanha eleitoral.

Após a chacina com mais de 120 mortes, Castro tem sido criticado em protestos como o realizado em São Paulo, na sexta-feira passada (Foto: Marina Uezima/Brazil Photo Press/Folhapress)

“Guerra na Carobinha. Tudo voltando ao ‘normal’ no Rio.” A legenda, publicada nas redes sociais na noite de 2 de novembro, acompanhava um vídeo sobre uma tentativa de invasão à favela em Campo Grande, zona norte do Rio de Janeiro, menos de uma semana depois da chacina nos complexos da Penha e do Alemão, que deixou mais de uma centena de mortos. “Ué, o CV não acabou?”, perguntou um. “Nada muda e a mídia quer média”, respondeu outro.

Cláudio Castro é, hoje, o governador com o maior número de mortes em operações policiais desde a redemocratização. Foi assim no Jacarezinho, em 2021 (28 mortos), e na Vila Cruzeiro, em 2022 (23). Com as vítimas do Alemão, o total passa de 170.

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Desde 2023, a Secretaria de Segurança Pública está sob o comando do delegado federal Victor dos Santos, indicado pelo senador Flávio Bolsonaro, do PL. Santos chefiava a Polícia Federal em Brasília durante os ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023 e chegou a defender a prisão domiciliar para os “manifestantes”. 

Em entrevista coletiva, chamou o Complexo do Alemão de “nove milhões de metros quadrados de desordem” — um resumo da lógica que equipara favelado a inimigo interno.

Após a chacina com mais de 120 mortes, Castro tem sido criticado em protestos como o realizado em São Paulo, na sexta-feira passada (Foto: Marina Uezima/Brazil Photo Press/Folhapress)
Após a chacina com mais de 120 mortes, Castro tem sido criticado em protestos como o realizado em São Paulo, no dia 31 de outubro (Foto: Marina Uezima/Brazil Photo Press/Folhapress)

A incursão no Alemão e na Penha aconteceu em um momento de rearticulação da direita no RJ. Reeleito em 2022, Castro, do PL, não pode disputar novo mandato e tenta manter relevância política para 2026. A operação e o discurso de guerra ao crime o reposicionam como liderança conservadora em um cenário em que o bolsonarismo busca sobrevivência eleitoral.

Governadores aliados, como Ronaldo Caiado, do União Brasil de Goiás, Romeu Zema, do Novo de Minas Gerais, e Jorginho Mello, do PL de Santa Catarina, correram a manifestar solidariedade. 

Parlamentares bolsonaristas exaltaram o modelo de Nayib Bukele, de El Salvador, e voltaram a falar em “narcoterrorismo” — termo usado para legitimar execuções e transferir o debate da segurança pública para o campo da política e da propaganda.

Nada muda no território

A verdade é que o Comando Vermelho, de fato, não acabou. Está em expansão há anos, disputando com o Primeiro Comando da Capital, o PCC, as rotas mais lucrativas do tráfico e do refino de cocaína no Norte e Nordeste — caminhos que alimentam mercados consumidores na Europa, América do Norte e Ásia.

Mas a operação que o governo do RJ classificou como “sucesso” não prendeu o principal alvo, não retomou território e tampouco desmontou a estrutura do tráfico. O principal alvo era Edgard Alves de Andrade, o Doca, apontado como líder local do Comando Vermelho. Ele segue foragido. Outros nomes mencionados pela polícia — como Gardenal — também não aparecem em nenhuma lista divulgada.

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Mesmo sem perícia concluída, autoridades afirmaram que todos os mortos eram criminosos, identificados pelo “contexto”, pelas “roupas camufladas” e pelo local onde estavam. O governo de Cláudio Castro chamou a operação de “ação de contenção”, mas o cotidiano nas comunidades prova o contrário, como vimos com a Carobinha.

Operações pontuais, sem a devida coordenação com outros poderes e instituições – que marcam a presença permanente do estado – não alteram a dinâmica local. Entrar com a polícia e sair no dia seguinte não muda o cotidiano das comunidades. O problema não é só o tráfico e o controle territorial sobre a vida das pessoas.

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